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Edição 342 - 11/2016

DEPENDÊNCIA QUÍMICA (págs. 8 e 9)

Cannabis


Cremesp defende descriminalização do porte de Cannabis
para uso próprio

Posicionamento refere-se a deixar de tratar como crime um tema
que deveria ter como foco a Saúde Pública

 

O Cremesp defende a descriminalização do porte de Cannabis para uso próprio, conforme nota pública (veja no box ao lado) divulgada no dia 1º de novembro, aprovada pela Câmara Técnica de Psiquiatria do Conselho, em 30 de setembro,  e pela plenária, no dia 25 de outubro.  O parecer inédito levou em consideração as consequên­cias do uso e do porte de drogas para a Saúde Pública e, portanto, o protagonismo da Medicina nesta discussão.

O posicionamento acontece no momento em que o Supremo Tribunal Federal (STF) brasileiro aprecia, desde agosto de 2015, um recurso extraordinário que pede a inconstitucionalidade do artigo da Lei de Drogas, que criminaliza usuários.  Para o ministro Luís Roberto Barroso, é preciso deixar claro o propósito do debate: “a discussão do processo diz respeito à descriminalização, e não à legalização. Vale dizer: o consumo de maconha ou de qualquer outra droga continuará a ser ilícito. O debate é saber se o Direito vai reagir com medidas penais ou com outros instrumentos, como, por exemplo, sanções administrativas. Isto inclui a possibilidade de apreensão, proibição de consumo em lugares públicos, submissão a tratamento de saúde etc.“, esclareceu em sua votação favorável à descriminalização.

 

Votação

Pelo menos três dos 11 ministros do STF, apesar de algumas divergências, entenderam que o porte de maconha para consumo próprio deve ser descriminalizado. Gilmar Mendes, relator do caso, defendeu que se descriminalize o uso de todas as drogas, explicando que seu voto nada tinha a ver com legalização. Edson Fachin também votou pela descriminalização, em setembro do ano passado, mas exclusivamente para a maconha, propondo a criação de um órgão, na esfera do STF, para tratar da questão das drogas. Também falando sobre a Cannabis, Luís Roberto Barroso propôs que, até que o Congresso decida, o STF deveria estabelecer uma quantidade por usuário, para que não fosse enquadrado como traficante, de 25 gramas de maconha.

 

Evidências

Desde 2012, o Cremesp argumenta que o tema das drogas e de seu consumo abusivo deve ser enfrentado na esfera da Saúde Pública, tendo como princípio fundamental a busca de um equilíbrio entre o interesse coletivo e o individual. Apoiado em evidências científicas, o Conselho sempre se empenhou em destacar os riscos à saúde associados ao consumo dessas substâncias e considera fundamental que haja políticas públicas que façam a prevenção de seu uso.  O modelo criminalizante, atualmente em vigor e majoritário na história brasileira, desfavorece o acesso da população às informações necessárias para o alerta sobre os danos causados pelo uso dessas substâncias e aos cuidados assistenciais a que têm direito aqueles que sofrem agravos dele decorrentes.

A lei federal nº 11.343 completa dez anos de vigência em agosto de 2016. A chamada Lei de Drogas prescreve medidas de prevenção do uso indevido, de atenção e reinserção social de usuá­rios e dependentes de drogas, estabelece normas para repressão à produção não autorizada e ao tráfico ilícito de drogas e define crimes. A análise do artigo 28 da lei, que trata da criminalização do porte de drogas para consumo próprio, está em tramitação no Supremo Tribunal Federal.

 

Penas

A lei institui penas que vão de advertência verbal a prestação de serviços à comunidade para quem porta qualquer tipo de droga, estendendo também as sanções a quem as cultiva.

O inciso 2º do artigo 28 é controverso na classificação de consumo pessoal e tráfico. Ele diz que quando uma droga é apreendida, o juiz deve considerar o tipo de substância, a quantidade, o local, as circunstâncias sociais e pessoais do portador, sua conduta e antecedentes.

Uma pesquisa coordenada pelo Instituto Sou da Paz em São Paulo, em 2015, demonstra que 80% das pessoas presas por tráfico de drogas no município poderiam ser consideradas como microtraficantes ou usuários, das quais 59% eram negros e pardos e 80% tinham até o ensino fundamental de escolaridade.  Além disso, 57% não tinham antecedentes criminais e 97% estavam desarmados.

Tráfico é o crime que mais encarcera no Brasil. Desde que a Lei de Drogas entrou em vigor, em 2006, o número de presos por tráfico, que era de 31 mil, chegou a 138 mil no País, em 2014, representando um aumento de 339%.


A descriminalização das drogas no mundo

O posicionamento do Cremesp não é unanimidade entre os Conselhos Regionais e Federal. O Conselho Federal de Medicina (CFM) defende a manutenção do artigo 28. Reafirmando a nota conjunta — com a Federação Nacional dos Médicos (Fenam), Associação Médica Brasileira (AMB) e Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP) —, de 2015, o CFM argumenta que a descriminalização aumentaria o número total de usuários de drogas e poder do tráfico e, com isso, de casos de dependência química, “com consequente repercussão nas famílias e na sociedade”.

Para o CFM, “não há evidência científica que mostre melhoria com a descriminalização de drogas ilícitas”. Mas, em diversos países, a descriminalização do uso da maconha (e de outras drogas ilícitas) tem sido implementada porque suas autoridades entenderam que a guerra às drogas foi incapaz de diminuir o consumo.

No Reino Unido, a Royal Society for Public Health e a Faculty of Public Health, renomadas organizações multidisciplinares independentes, que trabalham para a melhoria da saúde pública naquele país, se posicionaram favoráveis à descriminalização do porte de Cannabis e outras drogas. A decisão vai ao encontro da política de saúde de países como Canadá, Colômbia, República Tcheca, Romênia e França, que legalizaram a maconha, ou produtos a base de maconha, para fins medicinais. Nos Estados Unidos, onde há autonomia dos Estados para estabelecer suas próprias leis, mais de 20 deles já legalizaram a venda e o consumo da maconha, na maioria para uso medicinal.  O jornal britânico The Times, em editorial do dia 16 de junho deste ano, defendeu a descriminalização das drogas: “O governo deveria ser encorajado a pensar na descriminalização não como um fim em si mesmo, mas como um primeiro passo no sentido da legalização e regulação das drogas, como já é feito com álcool e tabaco”, pontuou.



Nota pública sobre descriminalização do porte de Cannabis para uso próprio

Em agosto de 2016 completaram-se dez anos de vigência da Lei 11.343, a chamada Lei de Drogas. Por tratar de assunto que se refere, entre outras áreas, à área da Saúde, cumpre ao Cremesp emitir posicionamento, diante dessa data, acerca das repercussões da referida Lei na Saúde Pública. Ademais, também dá ensejo a esta nota o trâmite da análise, pelo Supremo Tribunal Federal, da constitucionalidade do seu artigo 28, que trata da criminalização do porte de drogas para consumo próprio. O Cremesp vem se posicionando, desde 2012, pela interpretação de que o tema das drogas recreativas e de abuso deve ser enfrentado na esfera da Saúde Pública e, portanto, tem a medicina como um dos seus protagonistas. O tratamento desse complexo assunto deve ter como princípio fundamental a busca de um equilíbrio entre o interesse coletivo e o individual. Para que esse equilíbrio seja obtido, protegendo ao mesmo tempo indivíduo e sociedade, é passo fundamental que a legislação não penalize o usuário de substâncias psicoativas. O Cremesp, apoiado em evidências científicas, destaca os riscos à saúde associados ao uso de tais substâncias e considera fundamental que haja políticas de saúde públicas que façam a prevenção do uso de drogas. Ressalta que o modelo criminalizante, majoritário na História brasileira, desfavorece o acesso da população às informações necessárias para o alerta acerca dos danos causados pelo uso de substâncias e aos cuidados assistenciais a que têm direito aqueles que sofrem agravos dele decorrentes.

São Paulo, 30 de setembro de 2016.

Câmara Técnica de Psiquiatria
Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (Cremesp)

(aprovada na reunião da Câmara Técnica de Psiquiatria, de 30/09/2016, e na reunião plenária, realizada em 25/10/2016).


Entidades da Saúde e do Direito apoiam iniciativa do Cremesp

O posicionamento do Cremesp encontra eco em diversas instituições ligadas à Saúde,  ao Direito e à defesa dos Direitos Humanos, que veem o porte da Cannabis como uma questão de Saúde Pública.

Sinto-me congratulado pelo posicionamento externado pelo Cremesp. Não é possível lidar com a questão das drogas pensando apenas em proibição. As evidências científicas mostram que não há aumento de consumo em países que descriminalizaram a maconha. Percebe-se que aqueles que criticaram o Cremesp não usaram nenhuma evidência. São críticas basea­das em moralismo. A posição do Cremesp, como instituição de saúde, é muito coerente, pois a criminalização causa danos ao usuário e à sociedade. Tenho certeza de que o posicionamento do Cremesp irá auxiliar muito nessa discussão.”

Cristiano Maronna é doutor em Direito Penal e porta-voz do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (Ibccrim), do qual é 2º vice-presidente, e da Plataforma Brasileira de Política de Drogas (PBPD), da qual é secretário-executivo


O tema das drogas é o que Freud definiria como “de desconforto”. Mas a discussão sobre a descriminalização é da sociedade e afeta a Saúde Pública como um todo. Enquanto não se debate uma lei a respeito, o STF precisa estabelecer critérios e parâmetros objetivos. O posicionamento corajoso do Cremesp é fundamental para avançar no discurso e subsidiar julgamentos. Tomara que o STF também assim se defina. Se a postura em relação à descriminalização for acolhida e o STF se manifestar abonando a condição do usuário, isso pode se tornar referencial, inclusive, para a apaziguação social, em situações de violação de direitos humanos, principalmente dos mais desassistidos.”

Eduardo Dias, promotorde Justiça da Infância e Juventude da Capital e coordenador do Núcleo de Direitos Humanos e da área de Infância e Juventude e Direitos Difusos da PUC-SP


A posição do Conselho é bastante ponderada e condizente com a literatura recente de Saúde Pública. Enquanto médicos, queremos que as pessoas se tratem. O principal impacto da descriminalização do porte de uma droga parece ser aumentar o acesso ao tratamento para os usuário problemáticos de tal substância. Isso nos leva a pensar que é necessário conclamar pela descriminalização não só do porte da maconha, mas de todas as drogas. Além disso, não se deve tratar como criminosa uma pessoa que decidiu usar uma substância, desde que seu uso afete apenas o seu próprio corpo.”

Luís Fernando Tófoli, professor doutor do Departamento de Psicologia Médica e Psiquiatria da Unicamp


A descriminalização do porte de drogas para consumo pessoal é medida constitucionalmente legítima. Tanto pelas razões pragmáticas, nas quais se incluem o fracasso da atual política de drogas, o alto custo do encarceramento em massa e os prejuízos à saúde pública, quanto pelas jurídicas, como o direito à privacidade, a autonomia individual e a desproporcionalidade das punições. (...) Independentemente de qualquer juízo sobre a constitucionalidade da criminalização, impõe-se a determinação de um parâmetro objetivo, capaz de distinguir consumo pessoal e tráfico de drogas. A ausência dele produz um efeito discriminatório, na medida em que, na prática, ricos são tratados como usuários e pobres como traficantes.”

Luís Roberto Barroso, ministro do Supremo Tribunal Federal (em documento utilizado para votar sobre a descriminalização do porte de Cannabis)


As políticas de drogas guiadas por propostas de guerra contra as drogas seguem na contramão das políticas de baixa exigência e estrutura leve, próprias das iniciativas de redução de riscos e danos. A perspectiva da descriminalização — e despenalização – guarda a possibilidade de progredirmos no campo das terapêuticas. Assim, o Estado se veria convidado a pensar, delinear e implementar políticas públicas sobre drogas que se pautem pelo diálogo interdisciplinar das carreiras afetas à Saúde, Educação, Assistência Social e Segurança. Não se falaria mais na sobreposição da pauta de Segurança sobre as demais, mas de construção dialogada, voltada ao cuidado da pessoa em seu contexto.”

Aristeu Bertelli da Silva, presidente do Conselho Regional de Psicologia de SP

 

As políticas de drogas guiadas por propostas de guerra contra as drogas seguem na contramão das políticas de baixa exigência e estrutura leve, próprias das iniciativas de redução de riscos e danos. A perspectiva da descriminalização — e despenalização – guarda a possibilidade de progredirmos no campo das terapêuticas. Assim, o Estado se veria convidado a pensar, delinear e implementar políticas públicas sobre drogas que se pautem pelo diálogo interdisciplinar das carreiras afetas à Saúde, Educação, Assistência Social e Segurança. Não se falaria mais na sobreposição da pauta de Segurança sobre as demais, mas de construção dialogada, voltada ao cuidado da pessoa em seu contexto.”

Aristeu Bertelli da Silva, presidente do Conselho Regional de Psicologia de São Paulo

 

A defensoria pública aplaude a iniciativa do Cremesp. O tráfico é o crime que mais prende atualmente. A criminalização da maconha provoca consequên­cias, como o encarceramento de pessoas que são apenas usuárias e não traficantes e, em sua maioria, pobres. A atual política de guerra às drogas mata muito em nosso País porque, dentro de um presídio, a chance de morrer aumenta em seis vezes. A descriminalização desestabiliza o crime organizado e as substâncias serão utilizadas dentro do limite de danos. O tabu afasta os usuários, que são vítimas sociais, da Saúde Pública e do tratamento.”

Bruno Shimizu, defensor público do Estado de São Paulo

 

A descriminalização do porte da maconha para uso pessoal é o primeiro passo para a construção de uma política que trate o uso de drogas como uma questão de Saúde Pública, em lugar da abordagem ineficaz de repressão. Mais de 30 países já tiveram resultados positivos com a descriminalização de substâncias psicoativas e a oferta de serviços de saúde e de assistência a dependentes.Ficamos satisfeitos em saber que a classe médica de São Paulo apoia uma política de drogas baseada em evidências científicas e que coloca a saúde das pessoas em primeiro lugar. Que outros Conselhos sigam os passos do Cremesp.”

Ilona Szabó, diretora-executiva do Instituto Igarapé

 

A guerra às drogas é, comprovadamente, uma guerra contra as pessoas, na medida que ela agrava o quadro da violência no Brasil e contribui apenas para o encarceramento cada vez maior da população jovem e periférica. Portanto, descriminalizando as drogas, inclusive a Cannabis, o País começaria a corrigir problemas derivados dessa visão distorcida em relação às drogas, além do quê, seguiria uma tendência global de revisão da política de guerra às drogas.”

Rafael Custódio, coordenador do programa de Justiça da Conectas Direitos Humanos


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